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Quetzal

Na companhia dos livros. O blog da Quetzal Editores.

 

 

 

É este fim-de-semana, o encontro organizado pela Associação Cultural Amigos do Concelho de Avis. Vai haver encontros nas escolas, lançamentos de livros e música. António Manuel Venda, autor de, entre outros, O Sorriso Enigmático Javali, o livro que conta as aventuras do pequeno Tukie pelos montados do Alentejo, participa na quarta mesa, às 17h00 do dia 16 de Outubro, sábado.

 

«Os cães como doidos e o pai do pequeno Tuckie sem descobrir a razão. Cinco, dez, quinze, vinte minutos... Era de noite, muito de noite. Ele escrevia. Resolveu sair de casa e sentiu em menos de nada o choque do calor. O Verão já bem instalado. Lembrou-se de um livro que tinha escrito, ele a sair de noite de casa, a dar uma volta pelo monte, era Inverno e o frio atacava em força. Tinha nesse livro uma imagem, a dos arqueiros do vento frio, com as suas minúsculas setas que picavam no rosto, dezenas delas, se calhar centenas, ou mais até. Agora era o calor, e nem uma brisa que fosse capaz de o amenizar. O mesmo, ou quase o mesmo, lembrava-se, do calor da noite de fogo que tinha vivido uns anos antes, o incêndio da serra da sua infância, que tinha metido num pequeno romance.».

 

De O Sorriso Enigmático do Javali, de António Manuel Venda.

«O deputado «quase sem cabeça» e a história das lebres extraterrestres…como é que lhe surgiu essa ideia?
Já me aconteceram muitos episódios com lebres e coelhos, quando à noite vou a conduzir. Já cheguei a demorar meia-hora para fazer os últimos dois ou três quilómetros do percurso até casa, à noite, pelo montado, por se meterem lebres à frente do carro e depois ter de ir a vinte ou trinta à hora porque elas teimam em não abandonar as luzes. Por isso num livro como este eu teria de ter algo assim. O pequeno Tukie vai uma noite com o pai fazer uma viagem, só para verem as lebres aos saltos à frente do carro. Às vezes, os escritores dizem aqueles coisas de o livro tomar conta deles, ou a história, de alguém escrever por eles, de haver uma mão invisível tipo Adam Smith só que da literatura em vez de ser da economia… Eu nunca fui muito disso, mas pensando nesta aventura com as lebres talvez o aparecimento do deputado a que falta um bocado da cabeça tenha sido algo parecido. A certa altura, num cruzamento onde muitas vezes à noite eu tenho de parar para olhar para um lado e para o outro para ver se mesmo sem sinais de luzes se aproxima algum carro, nas viagens do Algarve para Alentejo, a certa altura eu estava a escrever, estava a contar que o pai do pequeno Tukie ia a chegar ao cruzamento, já com o filho a dormir, e então apareceu o deputado, em viagem de Lisboa para Beja para fazer, como depois se descobre, trabalho político. Há várias lebres que passam das luzes do carro do pai do pequeno Tukie para as luzes do carro do deputado. Não sei, talvez os escritores da mão invisível que lhes escreve tudo tenham um bocadinho de razão. Nem que seja só um bocadinho, porque depois de o deputado aparecer quem teve de se arranjar para chegar ao fim da história fui eu com as minhas próprias mãos no teclado do computador.»


António Manuel Venda em entrevista ao Diário Digital, hoje.

 

«Pelo barulho que fazia, podia-se pensar que era uma rã daquelas que estão nos charcos, nos tanques, nos cursos de água. Mas não, na verdade era uma rela. O pai do pequeno Tukie lia num livro de animais, o mesmo onde uma vez o pequeno Tukie tinha ido ver coisas sobre ginetas, enquanto estava uma acolhida no alpendre do forno depois da tentativa frustrada de roubar um gatinho de uma ninhada. Lá estava no livro, a rela, assim conhecida em Portugal, a Hyla arborea, uma espécie de rã da família Hylidae. Tudo palavras que o pai do pequeno Tukie nem suspeitava de que existissem. Aançou mais na leitura e ficou a saber que as relas tinham sido utilizadas como barómetros pelo facto de a aproximação de chuva fazer com que desatassem a coaxar.»

 

De O Sorriso Enigmático do Javali, de António Manuel Venda.

 

O lançamento do livro é já na quinta-feira, às 18h30, na Livraria Bertrand do Chiado, com apresentação de Luis Carmelo

«O pai do pequeno Tukie estava a viver a própria história que contava ao filho, uma história aumentada a cada pergunta que respondia. Aumentada já bem para a além do que tinha visto na série de antes do campeonato do mundo de futebol de Espanha, muitos anos antes. A certa altura, estava tão envolvido que pensou no que poderia implicar ter ali um perigoso imperador intergalático mais o seu exército. O melhor era prevenir. Cortar o mal pela raiz. Esmagar a nave espacial com o imperador e o exército lá dentro enquanto fosse tempo.

 

Foi ao pensar nisso, muito concentrado, que fez um movimento com a perna direita, levantando-a um pouco, devagar, bem por cima daquele perigo que tinha tomado conta da soleira da porta. Ia baixar a perna, com toda a força concentrada no pé, quando foi colocado de volta à realidade por um grito do filho:

 

- Pai, não faças mal à borboleta do imperador Ming!»

 

De O Sorriso Enigmático do Javali, de António Manuel Venda.

 

O lançamento do livro é já na quinta-feira, às 18h30, na Livraria Bertrand do Chiado, com apresentação de Luis Carmelo

«O pequeno Tukie e o pai observaram tudo em silêncio, e ficaram assim durante uns minutos, com a cobra a tentar libertar-se do seu próprio nó. Nenhum dos dois fez um gesto para ajudá-la, mas também nenhum dos dois fez um gesto para ajudá-la, mas também nenhum dos dois fez um gesto para atacá-la. Sabiam que aquela cobra não se ia salvar. Quando os movimentos se reduziram para algo que não era mais do que o lento tremor, o pai do pequeno Tukie aproximou-se do estendal, já a sentir o cheiro a carne queimada. Viu logo os pequenos olhos da cobra, e neles percebia-se bem a falta de luz que antes irradiavam. Mas não estavam parados, mexiam-se, para um lado e para o outro, devagar, como se procurassem qualquer coisa que pudesse valer à dona. A língua, pelo contrário, estava parada, saída da boca, como se já não tivesse vida. Aquela cobra, deu o pai do pequeno Tukie por si a pensar, começava a morrer pela língua. O que lhe morreria a seguir

 

De O Sorriso Enigmático do Javali, de António Manuel Venda.

 

O lançamento do livro é já na quinta-feira, às 18h30, na Livraria Bertrand do Chiado, com apresentação de Luis Carmelo.

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