Helena Vasconcelos, no Ípsilon, dá cinco estrelas a Acasalamento, de Norman Rush, e considera que o escritor criou «uma das melhores personagens literárias femininas das últimas décadas.
«O facto de toda a acção se desenrolar nos anos 70 do século passado acrescenta um certo exotismo e um contexto histórico excepcional. Rush que, com a mulher Elsa, passou exactamente essa época — de 1978 a 1983 — em África, integrado no Corpo da Paz, está perfeitamente familiarizado com os acontecimentos que determinaram as grandes viragens no continente: luta contra o apartheid na África do Sul, independência de países colonizados, auto-determinação e consolidação das teorias marxistas. No entanto, o autor nunca se deixa empolgar por ideologias e mantém, até ao desfecho, um distanciamento satírico, e uma postura afectuosamente crítica. Enquanto a acção se alonga com a mesma cadência que o tempo em África e os principais protagonistas vão perdendo o seu brilho heróico, Rush nunca se esquece que a sua tarefa mais importante é a de explorar o poder da linguagem. A mulher que tenta sempre aperfeiçoar o seu conhecimento é uma virtuosa do “idioverso”, uma mistura de termos em várias línguas (incluindo as nativas, como o tswana), de referências cruzadas, de piadas privadas, de neologismos, de citações, de estrangeirismos, manipulados e utilizados com avidez. Para ela, a intimidade suprema passa sempre pela linguagem — “ a decadência é quando se começam a perder os nomes das coisas (p. 211) — e a pobreza do vocabulário é uma condenação para qualquer sociedade. Quem não gostaria de lhe seguir os passos, atravessando um deserto e vivendo num lugar quase perfeito, onde todas as experiências são possíveis?»