Eduardo Pitta, na Sábado: «O penúltimo romance de Rachel Cusk (n. 1967), Trânsito, corresponde ao livro do meio da trilogia Outline, a história de uma escritora divorciada decidida a reformar uma casa em ruínas. A casa existe. Os amantes de parábolas têm aqui o relato escarolado do que seja reconstruir uma vida reduzida a cacos. A prosa irrepreensível de Cusk transfigura o quotidiano no tipo de narrativa que prende o leitor da primeira à última página. A acção decorre em Londres, numa zona isenta de glamour. A intriga salta com naturalidade de cenas da vida doméstica para reflexões sobre cães, formação de adolescentes, idiossincrasias literárias, responsabilidade social, trabalho precário, gentrificação, imigrantes, multiculturalismo, conjugalidade: "Não era propriamente a primeira vez que presenciara a homossexualidade: era a primeira vez que tinha presenciado amor." O fluxo da consciência nunca derrapa. Trânsito respeita a arquitectura da trilogia, mas tem vida própria.»