- Como é que sabe?
- Sei o quê?
- Que não vai acontecer nada.
- Que não vai acontecer nada? Ora, porque penso nisso, meu rapaz: aquilo que nos devia acontecer, já aconteceu.
- O quê? O que é que nos aconteceu?
De repente, Hagg-Bar diz:
- Chiu! Escuta.
- O que se passa, senhor?
- Não, deixa-me ouvir.
- Peço-lhe: diga-me o que se passa.
Com os sentidos alerta e a voz que se contrai num murmúrio, o homem enorme lança, instantes depois:
- Dir-se-ia que alguém mata alguém.
- Não!
- Sim.
Meditativo, Hagg-Bar repete:
- Sim. Tarde de mais.
- O senhor não acredita nisso. Não o diz a sério.
- Não há como saber. Esta imensidão é como uma porta que agora mesmo nos fecharam na cara. O próprio dia é uma outra porta. Haverá algures uma saída? Onde poderíamos encontrá-la? Aconteceu alguma coisa.
A ênfase de Hagg-Bar nestas últimas palavras em tudo se assemelhou ao rugido do leão. Falta apenas uma juba a este leão, mas as bandas do keffieh aí estão para a substituir. O alarme que a sua voz acaba de transmitir ao ar, paira ainda sem se extinguir.
O Deserto sem Saída, de Mohammed Dib | série mediterrâneo
Tradução de Catarina F. Almeida