Toda a semana quis ser Pepe. Acontece mesmo que antes desta semana eu já queria ser Pepe só que não sabia, porque nunca tinha lido Manuel Vázquez Montalbán, o escritor que morreu em 2003 no aeroporto de Bangkok. de um ataque cardíaco fulminante. Podem dizer-me que essa informação de nada acrescenta à literatura, mas é claro que sim. Quando me apaixono por um autor, quero saber tudo e sou acometida por duas síndromes: A de Zuckerman, isto é, tenho enorme dificuldade em distinguir o autor do narrador do livro, não me venham cá com coisas, porque é óbvio que os dois são um só. E a maravilhosa síndrome de Bulhão Pato, muito bem descrita por Rubem Fonseca no «Diário de um Fescenino», e que consiste na certeza do leitor (possivelmente ele referia-se a leitores básicos e egóticos, como eu) de que o autor se inspirou neles para escrever cenas ou inventar personagens. Ora, sendo eu dada a este tipo de maluquices pode depreender-se que na literatura como na vida, quando me apaixono é para valer. Na literatura passo anos entretida com o mesmo autor, sublinhando e dobrando os cantos dos livros jamais lendo outro, coisa que consideraria como tremenda traição. Na vida, pois na vida, não vamos por aí.
Isto para dizer que se me fosse possível o privilégio de mudar de sexo, passar a ser um homem, queria ser o personagem inventado por Manuel Vázquez Montalbán: Pepe Carvalho. Ou, como lhe chama Yes, em longos e magníficos faxes sem resposta (e ela pode, porque é o amor triste do detective): Urso das Cavernas. «O Homem da Minha Vida», é este o título soberbo do livro que acabo de ler.
Percebe-se o amor de Yes porque Pepe é um daqueles homens inevitáveis por quem se é capaz de deixar tudo. Ou começar a falar menos. Um detetive que adora pratos sofisticados e falar deles e cozinhá-los, um meticuloso na escolha dos restaurantes que frequenta. Um ser que sabe tão bem o que é a tristeza do amor que quando o vê lhe foge, e não se pode querer mais sedução que isto; agarrado a um imaginário livro de instruções que o impede de outras loucuras que não o amor céptico - se é que isso é possível - por Barcelona ou por putas.
Adorei. Pode dizer-se que um detective acabou comigo esta semana. Deve ser porque adoro homens tristes e calados. Lá está, Manuel Vázquez Montalbán deve ter sido um homem fantástico.
Mónica Marques é a primeira autora da Quetzal a deixar aqui no blogue uma sugestão de leitura.