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Quetzal

Na companhia dos livros. O blog da Quetzal Editores.

Perguntavas-me

(ou talvez não tenhas sido

tu, mas só a ti

naquele tempo eu ouvia)

porquê a poesia,

e não outra coisa qualquer:

a filosofia, o futebol, alguma mulher?

Eu não sabia

que a resposta estava

numa certa estrofe de

um certo poema de

Frei Luis de Léon que Poe

(acho que era Poe)

conhecia de cor,

em castelhano e tudo.

Porém se o soubesse
de pouco me teria

então servido, ou de nada.

Porque estavas inclinada

de um modo tão perfeito

sobre a mesa

e o meu coração batia

tão infundadamente no teu peito

sob a tua blusa acesa


que tudo o que soubesse não o saberia.

Hoje sei: escrevo

contra aquilo de que me lembro,

essa tarde parada, por exemplo.

 

Um poema de Manuel António Pina escolhido por Vasco Graça Moura para o livro 366 Poemas que Falam de Amor.

 


 

 

 

O mar, venho ver-lhe a pele a rebentar

ao longo das falésias, o que sempre

me traz a exaltação desses rapazes que circulam

por Lisboa no verão.

O mar está-lhes na pele. Partilho

com eles os quartos das pensões, sentindo as ondas

a avançar entre os lençóis. Perco-me à vista

da pedra onde o mar vem largar a pele.

 

Um poema de Luís Miguel Nava escolhido por Vasco Graça Moura para o livro 366 Poemas que Falam de Amor.

 


 

 

 

Como a vida sem caderneta

como a folha lisa da janela

como a cadela violeta

— ou a violenta cadela?

 

Como o estar egípcio emudado

no salão do navio de espelhos

como o nunca ter embarcado

ou só ter embarcado com velhos


Como ter-te procurado tanto

que haja qualquer coisa quebrada

como percorrer uma estrada

com memórias a cada canto


Como os lábios prendem o copo

como o copo prende a tua mão

como se o nosso louco amor louco

estivesse cheio de razão

 

E como se a vida fosse o foco

de um baço, lento projector

e nós dois ainda fôssemos pouco

para uma tempestade de cor

 

Um ao outro nos fôssemos pouco

meu amor meu amor meu amor
 

 

Um poema de Mário Cesariny de Vasconcelos escolhido por Vasco Graça Moura para o livro 366 Poemas que Falam de Amor.

 


 

 

 

 

«Eu acho que Roberto Bolaño é uma grandes revelações da literatura do nosso tempo. 2666 é a redescoberta do extraordinário poder do romance e da literatura. (...) Depois de ter lido Bolaño a nossa vida muda um pouco. Quer dizer, não se pode esquecer aquilo que ele deixou escrito, e que é uma tempestade, uma torrente, um delírio - como deve ser a literatura.»

 

Francisco José Viegas, director editorial da Quetzal, em declarações à Lusa. A peça completa aqui. Mais novidades aqui.

Eu quero amor feinho.

Amor feinho não olha um pro outro.

Uma vez encontrado é igual fé,

não teologa mais.

Duro de forte o amor feinho é magro, doido por sexo

e filhos tem os quantos haja.

Tudo que não fala, faz.

Planta beijo de três cores ao redor da casa

e saudade roxa e branca,

da comum e da dobrada.

Amor feinho é bom porque não fica velho.

Cuida do essencial; o que brilha nos olhos é o que é:

eu sou homem você é mulher.

Amor feinho não tem ilusão,
o que ele tem é esperança:

eu quero amor feinho.
 

 

Um poema de Adélia Prado escolhido por Vasco Graça Moura para o livro 366 Poemas que Falam de Amor.

 


 

 

 

Este poema começa por te comparar

com as constelações,

com os seus nomes mágicos

e desenhos precisos,

e depois

um jogo de palavras indica

que sem ti a astronomia

é uma ciência infeliz.

Em seguida, duas metáforas

introduzem o tema da luz

e dos contrastes

petrarquistas que existem

na mulher amada,

no refúgio triste da imaginação.


A segunda estrofe sugere

que a diversidade de seres vivos

prova a existência

de Deus

e a tua, ao mesmo tempo
que toma um por um

os atributos

que participam da tua natureza

e do espaço criador

do teu silêncio.

 

Uma hipérbole, finalmente,

diz que me fazes muita falta.

 

 

Um poema de Pedro Mexia escolhido por Vasco Graça Moura para o livro 366 Poemas que Falam de Amor.

 


 

 

 

Mais do que sonho: comoção!

Sinto-me tonto, enternecido,

quando, de noite, as minhas mãos

são o teu único vestido.

 

E recompões com essa veste,

que eu, sem saber, tinha tecido,

todo o pudor que desfizeste

como uma teia sem sentido;

todo o pudor que desfizeste

a meu pedido.

 

Mas nesse manto que desfias,

e que depois voltas a pôr,

eu reconheço os melhores dias

do nosso amor.
 

 

Um poema de David Mourão-Ferreira escolhido por Vasco Graça Moura para o livro 366 Poemas que Falam de Amor.

 


 

 

 

O tempo seca a beleza,

seca o amor, seca as palavras.

Deixa tudo solto, leve,

desunido para sempre

como as areias nas águas.

 

O tempo seca a saudade,

seca as lembranças e as lágrimas.

Deixa algum retrato, apenas,

vagando seco e vazio

como estas conchas das praias.

 

O tempo seca o desejo

e suas velhas batalhas.

Seca o frágil arabesco,

vestígio do musgo humano,

na densa turfa mortuária.

 

Esperarei pelo tempo

com suas conquistas áridas.

Esperarei que te seque,

não na terra, Amor-Perfeito,

num tempo depois das almas.

 

 

 

Um poema de Cecília Meireles escolhido por Vasco Graça Moura para o livro 366 Poemas que Falam de Amor.

 


 

 

 

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